Plástico Biodegradável e o Greenwashing: A falsa responsabilidade ambiental (V.7, N.1, P.1, 2024)

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Tempo de leitura: 5 minutos
#acessibilidade: Imagem de diversas partículas de plástico, em escala micrométrica, sobre a região da digital de um dedo de uma pessoa.

Texto escrito por Leonardo Martins Carneiro

Há várias décadas que sabemos que os materiais plásticos são grandes vilões da preservação ambiental. Em uma escala macroscópica, seu impacto pode ser visto nos animais marinhos que se engancham em pedaços de embalagens ou em enormes ilhas de plástico formadas nos oceanos, porém, mais recentemente está sendo amplamente divulgado seu impacto na escala micrométrica, com os chamados microplásticos, que são fragmentos de plásticos que podem interagir com o diversos organismos. Devido à alta durabilidade já conhecida dos materiais plásticos, já foi encontrado em locais de difícil acesso como a Fossa de Mariana, o local mais profundo do mundo!  Até na placenta e no leite materno já foi  detectado, podendo causar má formação e aumento do risco de câncer. Ou seja, devemos olhar com bastante preocupação para este novo poluente, porque os microplásticos são altamente tóxicos e invisíveis ao olho humano. 

Muitos de vocês podem pensar que já temos a solução: os plásticos biodegradáveis, que possuem larga distribuição no Brasil e já estão presentes em sacolas de supermercados, canudinhos e copos descartáveis. Porém, tenho uma péssima notícia para você: a maioria esmagadora desses plásticos não são verdadeiramente biodegradáveis, são apenas plásticos com a capacidade de se fragmentarem em pedaços muito pequenos, micrométricos – dando origem a que tipo de poluentes? Sim, os microplásticos. Mas não sinta que apenas você foi enganado, essa é uma estratégia comum das empresas para causar confusão em seus clientes. Essa estratégia é chamada de greenwashing.

Não se surpreenda caso nunca tenha se deparado com esse termo, até porque ele se parece bastante complicado para os falantes de português. O greenwashing é a junção de duas palavras em inglês: Green = verde; washing = lavar. A tradução literal não diz muita coisa, seria algo do tipo “lavagem verde” ou “maquiagem verde”, mas podemos entender Greenwashing como uma estratégia de comunicação com informações falsas ou enganosas sobre sustentabilidade, responsabilidade ecológica e ambiental, na forma de relatórios empresariais, propagandas, publicidade e rótulos de produtos.

Esta prática, apesar de ser pouco discutida no Brasil, está banida no território da União Europeia desde setembro de 2023. A medida busca banir termos como: ecologicamente responsável, natural, biodegradável, eco, climaticamente neutro, entre outros, sendo permitido apenas se a empresa apresentar excelentes resultados de desempenho ambiental, com comprovação científica. A nova regra visa tornar mais transparente as práticas de sustentabilidade das empresas. No Brasil, uma pesquisa, realizada em 2019 pela FIEP, mostrou que 87% dos consumidores preferem empresas com práticas sustentáveis e que 70% destas consideram pagar um pouco a mais por isso. 

Mas, cientificamente, por que os plásticos “biodegradáveis” não são, por si só, a solução? Idealmente, um plástico biodegradável deve ter a capacidade de se decompor, em condições ambientais ou por meio de microrganismos, em moléculas de água, gás carbônico e biomassa. Essa decomposição é possível, pois ao longo da cadeia há grupos funcionais suscetíveis a reações químicas que promovem a quebra da cadeia polimérica. Um bom exemplo é o poli(ácido láctico) (PLA), em que os meros são ligados através do grupo funcional éster, que pode receber um ataque hidrofílico gerando cadeias cada vez menores até o ponto de se tornar solúvel em água. No final do processo, será obtida uma solução aquosa concentrada de ácido láctico e acetaldeído, compostos que podem ser utilizados em novos processos na indústria química.  

acido lactico e acetaldeido - Plástico Biodegradável e o Greenwashing: A falsa responsabilidade ambiental (V.7, N.1, P.1, 2024)

#acessibilidade: Imagem da reação química do poli(ácido láctico).

A indústria dos plásticos descartáveis tem os polímeros Poli(etileno) (PE) e Poli(propileno ) (PP) como fontes de matéria prima para fabricação dos seus produtos. A primeira medida, buscando a redução do impacto ambiental, foi utilizar fontes alternativas, que não o petróleo, para os monômeros utilizados. Por exemplo, algumas indústrias químicas pasaram a produzir PE a partir do bagaço de cana de açúcar, e uma indústria cosmética começou a utilizar como matéria prima de embalagens outros plásticos extraídos do oceano, por exemplo. Porém, quando falamos de PE e PP biodegradáveis, estamos falando de longas cadeias carbônicas que possuem grupos funcionais suscetíveis de quebra de ligação ao longo da cadeia, porém, em uma quantidade muito menor do que o PLA, por exemplo. Com isso, o PE e o PP podem ser biodegradáveis, porém, o produto dessa degradação não é reaproveitado em outros processos, mantendo-se estável em diversos ambientes na forma de microplásticos, isto é, ainda são poluentes. 

Infelizmente, ainda não temos um produto à base de plástico, 100% biodegradável, com distribuição em larga escala. Por isso, não se iluda com termos como: “Feito com plástico retirado do oceano“, “oxibiodegradável”, “feito de plantas”, “bioplásticos”, “plástico reciclável”. São iniciativas interessantes, mas estão ainda longe de resolver o problema da poluição por plásticos. Empresas que utilizam esses termos então apenas mitigando o problema ambiental, e não resolvendo o problema da geração de lixo plástico, seja na forma de embalagens ou microplásticos. Mas não desanime, nos já sabemos quem irá desenvolver a solução pra este, e diversos outros, problemas, a Ciência!.

 

Fontes:

ZHU, Jingkun; WANG, Can. Biodegradable plastics: Green hope or greenwashing?. Marine pollution bulletin, v. 161, p. 111774, 2020.

Microplásticos são encontrados na placenta de mulheres grávidas, diz estudo – Portal G1. Disponível em: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/12/23/microplasticos-sao-encontrados-na-placenta-de-mulheres-gravidas-diz-estudo.ghtml.

Além do Titanic: plástico é encontrado em ponto mais profundo do oceano – Portal UOL ECOA. Disponível em: https://www.uol.com.br/ecoa/ultimas-noticias/2023/06/28/alem-do-submersivo-plastico-e-encontrado-em-ponto-mais-profundo-do oceano.htm.

Franchetti, Sandra Mara Martins, and José Carlos Marconato. “Polímeros biodegradáveis-uma solução parcial para diminuir a quantidade dos resíduos plásticos.” Química Nova 29 (2006): 811-816.

How to Recognize Plastic Pollution Greenwashing – Porta Plastic Pollution Coalition. Disponível em:  https://www.plasticpollutioncoalition.org/blog/2023/4/19/how-to-recognize-plastic-pollution-greenwashing.

 

Para saber mais:

O que é greenwashing? – Portal Exame. Disponível em: https://exame.com/esg/o-que-e-greenwashing/.

 

Outros divulgadores:

As ferramentas para combatermos o Greenwashing | Letícia Méo | TEDxMorroDaUrca. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=5jA3GccDPgo.

Despertar para a ciência, 3 maneiras de se resolver a crise da poluição de plásticos.  Instagram. Disponível em: https://www.instagram.com/p/C1Fn_GOvO0_/?igshid=N2ViNmM2MDRjNw==

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