Sapos e Física: o que tem a ver? (V.2, N.5, P.4, 2019)

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Leonardo Matheus Servino é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) – Campus Diadema. Atualmente é aluno de mestrado no programa de Pós-Graduação em Evolução e Diversidade da Universidade Federal do ABC (UFABC).

 

Quem disse que na Biologia não tem números?

 

Calma, isso não é pra assustar os adoradores da Biologia. Muito pelo contrário, a ideia é atrair pessoas que gostem das duas coisas. Muitos dos problemas biológicos podem ser resolvidos com cálculos, mas, nas escolas os alunos quase nunca lidam com as duas coisas juntas.

 

Pode ser que o exemplo dessa mistura mais fresco na cabeça das pessoas seja as aulas de genética, quando as continhas eram feitas pra descobrir as frequências de certos alelos nas gerações, ou a probabilidade de um filho nascer com uma doença genética, como Talassemia, Fenilcetonúria, Hemofilia, Daltonismo e entre outras. Vocês se lembram da professora ou professor explicando o “Azão/azinho”?

 

Crédito: elaborado pelo autor

 

Mas há todo um mundo por trás dessa mistura! Com uma abordagem diferente, a Biofísica é um campo que estuda processos físicos, bioquímicos e fisioquímicos nos seres vivos.

 

Um caso bem famoso é o dos camaleões. Você sabe por que esses répteis mudam de cor?

 

Os camaleões possuem células em sua pele chamadas de cromatóforos, que funcionam como prismas que esses animais conseguem reorganizar. Cada cor possui um comprimento de onda diferente, e, como um espelho, os camaleões conseguem refletir ou absorver cores diferentes pelos cromatóforos. Esse processo permite que esses animais mudem de cor, seja para camuflagem ou para atrair parceiros.

 

Camaleão. Crédito: Max Pixel

 

Eis um exemplo da mistura que é a Biofísica! De um lado, temos um conhecimento físico, que envolve fundamentos de óptica, e, do outro, uma adaptação biológica que resultou nos cromatóforos.

 

Agora que sabemos um pouco sobre a Biofísica, vamos um pouco mais fundo com outro exemplo.

 

No início deste 2019, pesquisadores brasileiros, em parceria com estrangeiros, publicaram um artigo na revista “The American Journalist” que propõe uma explicação para prever o tamanho corporal de sapos ao longo de suas distribuições, ou seja, prever o tamanho que os sapos terão dependendo da área geográfica em que se encontram.

 

Os sapos são animais de pele extremamente fina e permeável, e, por isso, perdem água muito facilmente para o ambiente. O motivo é que esses animais respiram e realizam funções de regulação de água e sais pela pele. Dessa forma, a perda de água pode ocorrer por evaporação, por condução (contato com uma superfície), ou por convecção (perda de água para um ambiente mais quente).

 

Uma rápida busca na internet mostra que existem sapos dos mais variados tamanhos e formas e isso pode influenciar nessa perda de água, pois, dependendo, de seu tamanho, eles podem armazenar mais ou menos água para desempenhar suas funções fisiológicas.

 

Assim como, dependendo das condições climáticas que vivem, isso pode influenciar na perda de água. Os sapos vivem em diversos tipos de ambientes, que podem ser quentes, frios, úmidos e secos.

 

Então, os autores da epsquisa usaram de algumas variáveis para montar uma equação, a fim de descobrir a taxa de evaporação da água por unidade da massa corporal (mₑ). Isso quer dizer que a equação ajuda a descobrir quanto o animal perderá de água por grama do seu peso. A equação é assim:

O “A” é a área da pele do animal que está em contato direto com o ar

 

O “M” representa a massa do animal.

 

O “∆ρ” é a diferença entre o vapor d’água presente no ar e na pele do animal.

 

Por fim, o “Rt” indica a resistência do animal à perda de água por evaporação, que é testada em laboratório.

 

Graças à Biofísica, foi possível chegar a uma proposta de solução para um problema da biologia!

 

É uma resposta muito boa, mas, como dito acima, há inúmeras espécies de sapos, com uma variação de tamanho gigantesca. A maior espécie de sapo do mundo é a rã-golias (Conraua goliath), que pode chegar até 35 centímetros de comprimento! Ao mesmo tempo, o menor anfíbio e também o menor vertebrado do mundo é o sapo Paedophryne amauensis, que pode chegar a um comprimento de apenas 7,7 milímetros, isso mesmo, estamos falando de milímetros! Esse sapo é mais ou menos do tamanho de uma mosca.

 

Rã-golias. Fonte: Talita Bateman

 

Paedophryne amauensis. Fonte: Rittmeyer et al. 2012

 

O uso da Biofísica em sapos é uma sacada muito boa, que pode ser testada incansavelmente para verificar se os resultados são satisfatórios, já que no caso dos anfíbios, muitas espécies possuem suas particularidades. Temos algumas espécies que permanecem mais próximas da água, e outras que permanecem afastadas de locais muito úmidos. E, como as pesquisas geralmente são, o artigo recém-publicado, terá muito a oferecer e levantará inúmeras outras perguntas.

 

Aos pouquinhos, por meio de parcerias entre pesquisadores, a natureza ao nosso redor vai sendo cada vez mais explicada, graças à colaboração entre diversas áreas de estudo,  o que é muito bom, pois a interdisciplinaridade gera muitas oportunidades e serve de inspiração para você que curte fazer cálculos, mas que também possui uma paixão pela biologia, explorar campos superinovadores!

 

Imagem destacada: Max Pixels

 

Referências

 

Dong, M., & Zhong, L. (2011). Chameleon: a color-adaptive web browser for mobile OLED displays. In Proceedings of the 9th international conference on Mobile systems, applications, and services (pp. 85-98). ACM.

 

Gouveia, S. F., Bovo, R. P., Rubalcaba, J. G., Da Silva, F. R., Maciel, N. M., Andrade, D. V., & Martinez, P. A. (2019). Biophysical modeling of water economy can explain geographic gradient of body size in anurans. The American Naturalist193(1), 51-58.

 

Herrmann, H., Bohme, W., Herrmann, P. A., Plath, M., Schmitz, A., & Solbach, M. (2005). African biodiversity hotspots: the amphibians of Mt. Nlonako, Cameroon. SALAMANDRA-BONN-, 41(1/2), 61.

 

Rittmeyer, E. N., Allison, A., Gründler, M. C., Thompson, D. K., & Austin, C. C. (2012). Ecological guild evolution and the discovery of the world’s smallest vertebrate. PLoS One7(1), e29797.

 

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