[ENTREVISTA] Água em Marte: os próximos passos para a pesquisa espacial (V.1, N.2, P.6, 2018)

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Tempo de leitura: 5 minutos
#acessibilidade Fotografia de uma palestra do professor Ivan sobre o projeto dele na Usp.

Olá entusiastas!

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Fonte: Arquivo pessoal

Nesta semana foi anunciada a descoberta de um lago de água no estado líquido em Marte. Para entender melhor os desdobramentos dessa ‘bomba’ do mundo da ciência entrevistamos o Pesquisador do Blue Marble Space Institute of Science, ligado à NASA, o Prof. Dr. Ivan Glaucio Paulino Lima, que além da importância dessa descoberta para o mundo científico e o futuro da pesquisa no mundo, vai falar também sobre sua trajetória na Ciência e como foi parar em um laboratório dentro da NASA!

A seguir a entrevista na íntegra:

Bom professor, primeiro é um prazer conversar com você. Eu queria que você falasse um pouco da sua trajetória e como sua pesquisa acabou te levando a trabalhar na Nasa, só para contextualizar.

Eu fiz faculdade de Ciências Biológicas na Universidade Estadual de Londrina, Mestrado em Genética e Biologia Molecular lá também, na área de controle biológico de fungos controladores de pragas da agricultura. Para o meu doutorado queria algo relacionado à astrobiologia, pois sabia que isso iria definir minha carreira. Em 2006 teve o Primeiro Workshop de Astrobiologia do Brasil no Rio de Janeiro, onde conheci a Prof Claudia Lage, do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Escrevemos um projeto e fui aprovado em segundo lugar no programa de doutorado lá. Minha tese foi sobre os limites de sobrevivência da bactéria Deinococcus Radiodurans em condições extraterrestres, verificando os efeitos da radiação cósmica nessa bactéria. Em 2009 tive a oportunidade de fazer um estágio sanduíche na Open University, Inglaterra, onde tive contato com vários pesquisadores de renome na Europa e fiz experimentos em Oxford, Irlanda do Norte, Dinamarca e Itália. Em 2010 o Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo promoveu um curso avançado de Astrofísica em São José dos Campos e convidou a pesquisadora da NASA, Lynn Rothschild. A data coincidia com a época da minha defesa de tese. Convidei ela para ser banca da minha tese e para minha surpresa ela aceitou! Defendi o doutorado e apresentei um projeto de pós-doutorado para fazer lá com ela. Consegui uma bolsa da CAPES e quando cheguei lá em 2011 consegui uma bolsa da NASA. Concluí o meu pós doutorado em 2015 e fui contratado como Microbiologista Sênior para trabalhar como Co-Investigador Principal em uma missão espacial e estou lá até hoje. Importante salientar que eu não sou pesquisador da NASA. Eu trabalho para um instituto de pesquisa que presta serviço para a NASA, chamado Blue Marble Space Institute of Science. Meu escritório e meu laboratório são dentro da NASA, mas eu sou cientista do BMSIS na NASA. Aqui no Brasil eu faço parte da equipe científica da Primeira Missão Lunar Brasileira, chamada Garatea-L, e colaboro também no projeto Garatea-ISS, que desde o ano passado tem permitido que alunos do ensino básico enviem experimentos para a Estação Espacial Internacional, ambos liderados pelo meu amigo engenheiro Lucas Fonseca.

O que muda agora com essa descoberta de água líquida em Marte nas pesquisas de Astrobiologia?

Marte se torna o principal alvo das missões por uma série de motivos. Ele é o nosso vizinho no sistema solar, ou seja, novas missões podem ser planejadas a cada 2 anos aproximadamente, que é quando ocorre o alinhamento entre os dois planetas. O sítio onde foi descoberto este lago subglacial gigantesco se torna automaticamente um dos principais alvos do sistema solar para as futuras missões espaciais a procura de vida.

Qual a importância das pesquisas espaciais nesse escopo para a vida na Terra?

As pesquisas espaciais nesse escopo para a vida na Terra são importantes pois injetam um estímulo muito grande para a realização do que talvez seja a maior descoberta científica da humanidade, que é a descoberta de vida extraterrestre, a descoberta de que não estamos sós no universo. A presença de uma simples bactéria em Marte poderia significar que o universo está repleto de vida. Isso seria um atestado de que a vida pode se proliferar além da Terra. Isso sem falar em todo o potencial de exploração do ambiente marciano e eventual aplicação dessas descobertas para melhorar nossa vida aqui no nosso planeta.

O fato de encontrar água em um planeta é realmente um indício direto que pode haver vida, mesmo que microscópica?

A descoberta de água fora da Terra é sim um indício direto de que pode haver vida, pois até onde sabemos, aqui na Terra, onde há água em ambientes naturais, há vida.

As chances de encontrarmos vida em outros planetas aumenta com uma descoberta como essa?

As chances de se encontrar vida em outros planetas aumenta significativamente, seguindo a progressão das descobertas dos últimos tempos, como os gêiseres de água das luas Europa, de Júpiter e Encéladus, de Saturno. Podemos dizer que existe um consenso na comunidade científica de que é uma questão de tempo até descobrirmos formas de vida se proliferando em outros locais do sistema solar e além. Estamos cada vez mais próximo dessa descoberta.

Qual a dificuldade de procurarmos vida fora da Terra, sendo que só conhecemos a vida que existe na Terra? Ela não poderia ser diferente? E quais os desafios das pesquisas com esse escopo?

A grande dificuldade são os investimentos gigantescos que precisam ser feitos em missões dessa magnitude. Além disso, as grandes distâncias do sistema solar exigem uma estabilidade dos programas de investimento, pois essas missões duram vários anos e as vezes até décadas! Por isso, a tecnologia tem que ser a mais avançada possível, pois em poucos anos as ferramentas se tornam ultrapassadas. Do ponto de vista científico, o único exemplo de vida que conhecemos é a vida na Terra. Então não podemos fugir muito disso. A vida como conhecemos provavelmente é preponderante no universo, por vários motivos. Isso não quer dizer que as chamadas bioquímicas alternativas são impossíveis. Elas seriam possíveis em locais muito específicos, sob condições muito peculiares. Não temos como basear nossa busca em algo que não conhecemos. Muito provavelmente o que nos é familiar é também preponderante no universo. Por isso as missões espaciais de procura por vida buscam parâmetros fundamentais: (i) presença de água, (ii) fonte de nutrientes e (iii) fonte de energia. Essa descoberta de Marte satisfaz o primeiro requisito e como o planeta é muito gelado, se a água existe em estado líquido, existe alguma fonte de energia que a mantém no estado líquido. E existem modelos microbianos aqui na Terra que mostram que é possível que sobrevivam em Marte. Por isso essa descoberta é tão importante, na minha opinião a mais sensacional sobre Marte até o momento.

Muito obrigado, professor.

Eu que agradeço pelo convite.

Fontes:

Fonte da imagem destacada: Arquivo pessoal.

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